sexta-feira, 12 de junho de 2009

A Origem dos Vagalumes

Sobre um Original de Coelho Neto

No princípio tudo era sombra e silêncio. E Deus, naquela altura, lapidava os astros: os diamantes do céu. Lapidava-os, e a poeira luminosa que deles se esparzia ia se espalhando, formando a Via Láctea e as outras nebulosas. Logo que um astro fulgurava, Deus, deixando-o engastado, tomava um pouco de treva e punha-se a bruni-la. E assim, conseguiu fazer todas as estrelas que brilham. O sol é um topázio enorme e a lua uma opala triste.

Lapidando os astros, o Senhor nem podia pensar que parte da poeira micante pudesse descer à Terra.

Tendo de criar os animais e o homem, desceu ao mundo deserto. Caminhando devagar pela sombra, de repente viu fulgir entre as árvores virgens uma pequena chama fugaz. Deteve o andar, e pensativo, ficou acompanhando a viagem aérea e volteante da fagulha de origem desconhecida.

Vendo-a ir e vir e vendo que outras surgiam, o bom Deus, não querendo que o demônio astuto pusesse malefício em sua obra e julgando as chamas erradias criações do Mau Anjo, - porque não se lembrava de as haver criado Ele mesmo - tomou no espaço uma das que passavam e, com seu alto poder, fez com que a centelha falasse.
E entre seus dedos, a centelha falou:

— Senhor, deixai-me livre. Não me julgueis provinda de origem má. Chama, não fui gerada nos braseiros infernais, Eu venho das claras estrelas que fulguram no céu. Quando o Senhor as lapidava, delas saía uma poeira luminosa que se espalhou pelos espaços formando estradas. Porém, alguns grãos pequeninos dessa poeira rutilante vieram dar à Terra, e, porque nelas havia tocado vossa mão, logo se animaram. E, à noite, bem á hora em que as estrelas brilham no céu, a poeira das estrelas vive e brilha na terra! Bem vedes que de Vós venho. Deixai-me ir, Senhor! Deixai-me ir por entre as árvores que cheiram e por cima das águas brancas que murmuram.

E o Senhor, enternecido, abriu os dedos deixando partir o vagalume.

Aí tendes porque não é fixa, como a das estrelas, a luz do vagalume: é que ela esteve, algum tempo, abafada entre os dedos do Senhor Deus Criador, e é por Sua obra e graça, até hoje, que o inseto guarda essa instantânea impressão.

Nota - Esta bela história sobre a origem dos vagalumes, escrita por Coelho Neto, tem um espírito tão parecido com o das lendas populares, que não dá para resistir à vontade de passá-la adiante. Eu a encontrei, alguns muitos anos atrás, num baú perdido no tempo, penso que chamado "Insetos nos folclore", e hoje, dei com ela no meu baú iMac particular. Espero que chegue outros olhos e a outros corações apaixonados como o meu.

quinta-feira, 27 de março de 2008

Mais vale a fé do que o pau da barca

Diz a história que um homem estava muito doente, quase, quase beirando a morte. Tão grave que nem a Esperança lhe fazia mais companhia. Da doença, ninguém nada sabia. De remédios, menos ainda. Até que alguém chegou e disse - e disse por ouvir dizer - que, do outro lado do rio que passava em frente à casa, um rio largo, tão largo que nem se conseguia ver a outra margem, crescia uma árvore enorme, que nem se lhe via a copa.
Desta árvore se dizia ter poderes de medicina, que um chá das lascas de sua madeira, curava qualquer mazela, mesmo desconhecida.

Então um certo compadre, barqueiro por profissão, prometeu ao doente que atravessaria o rio em busca do tal remédio. E lá se foi o barqueiro, cumprir a sua tarefa. Só que no meio da lida, do outro lado do rio, encontrou uns outros gajos (e umas gajas também, por certo) e caiu numa folia, que vai conversa, vem conversa, esqueceu sua promessa. E fez o caminho de volta sem ter da árvore uma lasca.

Estando quase a chegar de volta a sua aldeia, o gajo lembrou a promessa, mas não se deu por achado: pegou a faca afiada e tirou algumas lascas do fundo do próprio barco e embrulhou, direitinho para levar ao doente.

Foi feito o chá, sem demora e sem demora tomado.

Passado um tempo de chá, descanso e muita oração, o homem, recuperado, foi agradecer ao outro o tal chá amilagrado. Depois do abraço apertado, e de muita falação, o barqueiro, aliviado, com um sorriso maroto, resmungou 'pros' seus botões:

Bem minha mãe me dizia: "mais vale a fé do que o pau da barca."

sexta-feira, 21 de março de 2008

Uma História de Páscoa

Uma História de Páscoa
*
Por Que o Tiê Sangue Tem as Penas do Corpo Vermelhas e as Asas Negras
Por Ilnéa País de Miranda

Diz, que depois que o coração de Jesus foi atravessado pela lança do soldado, o mundo escureceu e um vento forte e frio varreu toda a terra.

Maria, mãe de Jesus, muito apiedada de Seu Filho, queria mais era abraçá-lo para que ele não sentisse aquele vento tão gelado e cortante

Mas Jesus estava longe de seu alcance, pregado lá em cima, numa cruz

E Maria chorou, e pediu por um milagre que aquecesse Seu Filho

Foi então, que vindo não se sabe de onde, um bando de pássaros veio voando contra o vento e, um após outro foram cobrindo com seus corpos o corpo nu de Jesus.

E ficaram assim, até o tempo clarear de novo.

Durante esse tempo, o sangue das chagas se misturou às penas dos pássaros

E é por isso que desde então os tiês, que antes não tinham cor definida, passaram a ter o corpo coberto por penas vermelhas como o sangue e as asas e a cauda negras como a tristeza do mundo pela morte de seu Salvador.

Boa Páscoa, amigos.
Abraço grande,
I